segunda-feira, 7 de agosto de 2023

FILHOS E BRINQUEDOS...(Entrevista - Francesco Tonucci)

 

“Gastamos muito para encher nossos filhos de brinquedos, convertendo-os de brincadores para possuidores”

POR JULIA DIETRICH

 

“As crianças precisam de mais liberdade e alguns brinquedos, devem ser autônomos, brincar com os amigos e, na medida do possível, ir para a escola, caminhando, sozinhos e a pé. É assim que Francesco Tonucci, pedagogo e pensador italiano resume sua filosofia e agenda política. Ele, que é autor e promotor do conceito “Cidade das Crianças”, um projeto que aposta na transformação das cidades por meio das crianças que nela habitam, defende que todas as políticas urbanas deveriam se estabelecer para garantir o direito ao brincar das crianças.


Célebre por ser “radical na defesa da infância”, o autor também publica sob o pseudônimo Frato uma série de quadrinhos em que discute, de forma irônica, o cenário escolar e a estrutura familiar contemporânea, que muitas vezes, impede a criatividade e a possibilidade de criação e reinvenção das crianças.

 

Em entrevista ao site El Intransigente, periódico Argentino, Tonnucci, que esteve no país em agosto deste ano, afirmou que os pais precisam deixar de superproteger seus filhos e permitir que desenvolvam suas próprias experiências de autonomia, entendendo o brincar para o pleno desenvolvimento das pessoas.

 

Confira a entrevista do pedagogo ao portal, traduzida para o português pelo Centro de Referências em Educação Integral.

 

El Intransigente: É fundamental que as crianças brinquem, mas quão importante isso é?

Francesco Tonucci: O brincar está conectado de uma

maneira muito forte com o movimento e com a autonomia. Temos que ajudar os adultos a entender a importância disso. Para explicar, lhe conto uma anedota; meu filho mais novo chegou do seu primeiro dia na escola primária e me contou “a professora nos disse que agora é hora de parar de brincar, temos que levar as coisas a sério.” Essa foi a mensagem da escola ao meu filho. E, desde então, venho tentando dizer às pessoas que esta é uma frase absurda, equivocada e perigosa. Não tenho dúvidas que os primeiros anos são os mais ricos e importantes na vida de uma pessoa; é o período em que se fundam todos nossos cimentos.

 

Garantir o direito ao brincar é chave para desenvolvimento integral de crianças

 

A “Cidade das Crianças” é uma iniciativa que nasceu em 1991, em Fano, na Itália, e apresentou uma nova filosofia de governança dos municípios, tomando as crianças como parâmetro e como garantia das necessidades de todos os cidadãos. Inspirados no projeto, nasceu a rede de cidade das crianças. Em Roma, na Itália, as crianças passaram a compor um parlamento infantil, capaz de incidir sobre as políticas públicas locais.

 

El Intransigente: E o jogo ajuda…

Tonucci: Nestes anos iniciais não existem professores no sentido público, não existem métodos. Simplesmente há uma criança que brinca com o mundo. Essa é a importância do jogo; ele é uma experiência em que as crianças vivem no nível espontâneo e não é necessário ensiná-las isso. É brincando que as crianças têm sua primeira relação com o mundo.

 

El Intransigente: Todo tipo de brincar é valioso? Brincar ao ar livre é o mesmo que brincar no computador?

Tonucci: Brincar é uma experiência que tem algumas

características: sair no sentido de não ficar sob controle direto dos adultos, encontrar-se com amigos, aproveitando um tempo livre para viver a experiência da aventura, do descobrimento, da surpresa, da maravilha, do risco. Tendo estes elementos, todos os jogos são bons. Inclusive os tecnológicos.


El Intransigente: Por que é importante que as crianças brinquem sozinhas?

Tonucci: Não é possível brincar acompanhado de adultos. Quando os pais dizem, “acompanho meus filhos todos os dias para que brinquem na praça” é uma contradição. O verbo brincar só se conjuga com o verbo deixar. Na Europa é impressionante, mas aqui [na Argentina] também creio que acontece, em especial nas classes sociais mais ricas; para uma criança é quase impossível sair sozinho pelas ruas. E isso os impede essa experiência básica.

 

Muitas vezes nós, adultos, pensamos em substituir esta experiência que desfrutamos nós mesmos e parece que as crianças não conseguem viver. Substituímos isso comprando muitos brinquedos, dando instrumentos que permitem que a criança passe muito tempo se entretendo sozinho em casa, especialmente com as novas tecnologias, e os acompanhando em todos os lugares. Todas respostas inadequadas. Estamos gastando muito dinheiro para encher nossos filhos de brinquedos, convertendo-os de “brincadores” para consumidores, “possuidores”. Para brincar bem, é preciso ter poucos brinquedos, mas amigos para aproveitá-los.

 

El Intransigente: O que oferece o brincar a uma criança?

Tonucci: Lhe permite descobrir o mundo. É uma maneira de encontrar-se com o desconhecido. Significa viver a experiência do risco, de saltar o obstáculo, viver o desafio de superá-lo ou não. Ver se hoje posso fazer o que antes não podia, se posso superar meu medo de viver esta experiência.


El Intransigente: Por que é importante viver a experiência do risco?

Tonucci: Se não é possível, vamos criar uma acumulação de desejos e de necessidade de transgressão que se expressarão mais tarde, na adolescência, quando um garoto tem autonomia suficiente como as chaves de casa no bolso ou quando essa expressão de seu desejo se converte em uma explosão perigosa.

 

Muitas das questões que hoje tratamos como os dramas da adolescência, como abuso de álcool, de drogas, acidentes de

moto, – até os casos de suicídio juvenil -, tem a ver com a falta de experiências de autonomia nos primeiros anos de vida da criança. É vivendo a experiência do obstáculo que nos damos conta de que não podemos superá-lo e é aí que vivemos a desilusão. E a desilusão também é uma experiência que as crianças não vivem porque seus pais os superprotegem.


FONTE - https://educacaointegral.org.br/reportagens/gastamos-muito-dinheiro-para-encher-nossos-filhos-de-brinquedos-convertendo-os-de-brincadores-para-possuidores/  Publicado em  30/10/2014

 


Sobre Francesco Tonucci - pensador, psicólogo educacional e cartunista italiano, que dedicou muitos de seus trabalhos à reflexão sobre a infância e a educação.

 

Julia Nader Dietrichs – jornalista, pesquisadora, foi gestora do Centro de Referências em Educação Integral.


OBS - Grifos feitos por mim,

 


 

quinta-feira, 3 de agosto de 2023

Crianças com baixa tolerância à frustração: quando os limites foram ultrapassados. (Fonte: Oeste em Foco)

 

Por - Fonte: Oeste em Foco

Postado/Atualizado em 05/02/2020 às 13h21

 

Outro dia vivenciei uma cena um tanto quanto indignante: uma criança, mais ou menos de 5, 6 anos talvez, pedindo dinheiro para a mãe. A mesma disse que não tinha no momento, nessa hora a criança chutou, gritou, esperneou e pasmem: xingou a mãe com um palavrão que não cabe aqui mencionar. Me perguntei o motivo da criança querer dinheiro? Bom fosse dinheiro, um brinquedo, ou algo para comer, receber um não para algumas crianças é devastador. Tudo tem que ser na hora, pra ontem, caso não recebam a cena acima acontece.

 

A frustração se manifesta quando um projeto, uma ilusão ou um desejo não chega a se cumprir, gerando um conjunto de emoções como a tristeza, aborrecimento, ansiedade, angústia, decepção. Com todos nós isso é normal. E sempre pode acontecer.

 

O que tem ocorrido com grande frequência, são comportamentos extremos de intolerância infantil, diante dos mais variados acontecimentos da vida.

 

Ensinar nossos filhos a lidar com esse tipo de situação lhes ajudará, no futuro, a serem adultos pacientes e que conseguem tomar melhores decisões. Sabemos que as dificuldades da vida só tendem a crescer conforme formos nos tornando adultos: não passar no vestibular, ter aquele financiamento negado, não passar na entrevista de emprego, não ganhar na loteria depois de ter feito uns 30 jogos e por aí vai.

 

Para que as crianças possam enfrentar de maneira efetiva as diferentes circunstâncias da vida diária, é necessário que aprendam a tolerar desde pequenas a frustração.

 

Cada criança tem sua maneira particular de reagir e enfrentar essas situações.

 

Isso tudo é importante para que eles saibam que não podem ter tudo perfeito, na hora que quiserem. Eles precisam entender que

pode ser que terão que batalhar para realizar seus sonhos, e que os outros não estão a postos para servi-los 24 horas por dia. Criar-se-ia uma geração que não suporta perder, que faria qualquer coisa e passaria por cima de qualquer um pra ter o que quer, afinal, esse adulto, quando criança, não aprendeu a receber um “não”, não aprendeu que pode não ter tudo.

 

Uma maneira de favorecer o desenvolvimento integral da criança é ajudá-la a assumir que na vida existem situações tanto de fracasso quanto de sucesso. Crianças com baixa tolerância à frustração são mais impacientes e impulsivas, tem dificuldade de controlar suas emoções, são muito exigentes, choram e fazem birra se não conseguem seus objetivos, são mais propensas a desenvolver quadros de depressão ou ansiedade frente a dificuldades ou conflitos importantes pois não sabem trabalhar com eles, possuem uma reduzida capacidade de adaptação e flexibilidade.

 

Cabe aos pais, mostrar todos os lados de um acontecimento para a criança, podendo deixar que ela mesma tome algumas decisões, sempre deixando claro que ela terá que arcar com as consequências. Assim a criança saberá entender que tudo tem limite, e que ela deve também ser responsável por suas atitudes. Interessante deixar claro que é algo normal cometer erros e que expressar os sentimentos é uma maneira de bater de frente com as situações que causam frustração.

 

É fundamental que a criança aprenda a diferenciar suas necessidades reais de seus desejos impulsivos. Também, os pais podem esclarecer para o filho a situação que se encontram no momento, por exemplo: a filha quer ganhar de presente uma boneca que custa R$ 150,00, mas no momento os pais não tem nenhuma condição financeira de dar o presente. A criança deve compreender isso - claro que o diálogo precisa se enquadrar na idade da criança-, e os pais também, para que ao satisfazer o desejo da filha, não acabem comprometendo o orçamento familiar (sim alguns pais fazem isso).

 

 

Em muitos casos, o carinho e a compreensão são as maiores estratégias para evitar a baixa tolerância à frustração, pois situações nas quais não se pode evitar, o mais importante é ensinar seu filho a identificá-la, de maneira que seja mais fácil para canalizá-la e pedir ajuda quando necessário.

 

 

FONTE - Por - Fonte: Oeste em Foco. Postado/Atualizado em 05/02/2020 às 13h21

https://www.oesteemfoco.com.br/noticia/9174/criancas-com-baixa-tolerancia-a-frustracao

 

OBS – Grifos feitos por mim