terça-feira, 30 de janeiro de 2024

Ausência (Carlos Drummond de Andrade)

 

Por muito tempo achei que a ausência é falta.

E lastimava, ignorante, a falta.

Hoje não a lastimo.

Não há falta na ausência.

A ausência é um estar em mim.

E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,

que rio e danço e invento exclamações alegres,

porque a ausência, essa ausência assimilada,

ninguém a rouba mais de mim.




Sobre o Autor - Carlos Drummond de Andrade foi um poeta, farmacêutico, contista e cronista brasileiro, considerado por muitos o mais influente poeta brasileiro do século XX. Nascimento: 31 de outubro de 1902, Itabira, Minas Gerais. Falecimento: 17 de agosto de 1987, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro



sexta-feira, 26 de janeiro de 2024

Criança diz cada uma…

 

Adultos são o que as crianças se tornam depois que começam

 a produzir hormônios e a largar sonhos pelo caminho. E é

 assim que nos tornamos maduros, responsáveis e

 burrocráticos.”  – Pedro Bloch.

 

 Aos 14 anos, mais ou menos quando descobri o quanto a educação me fascinava, descobri também uma coleção de revistas Pais e Filhos da minha mãe, da época de gravidez (86-87). Antigas, amareladas, mas com um grande tesouro dentro: uma coluna chamada “Criança diz cada uma…”, assinada pelo médico, dramaturgo e escritor de livros infantis Pedro Bloch.

Em todas as edições, ele recolhia algumas das tiradas engraçadas que saiam das boquinhas de seus pacientes, em seu consultório pediátrico, ou que haviam sido contadas a ele por pais ou professores:

Um menino de três anos foi com seu pai ver uma ninhada de gatinhos que haviam acabado de nascer. De volta a casa, contou, com excitação, para sua mãe que havia gatinhos e gatinhas.

 Como você soube disso? — perguntou a mãe.

Papai os levantou e olhou por baixo —, respondeu o menino. — Acho que ali estava a etiqueta. 

Não sei quantas tardes passei folheando essas preciosidades! Eu me divertia horrores, enquanto prometia pra mim mesma que nunca iria engessar meu pensamento sobre as crianças.

Hoje percebo que temos tantas pequeninas fontes preciosas na nossa frente, e a tendência é não darmos valor… como mãe, porque o dia-a-dia é corrido, porque estamos sempre cansadas; como professora, porque temos muitas competências a atingir, objetivos a alcançar, tarefas a completar… porque são muitos alunos ao mesmo tempo… A convivência e o relacionamento adulto-criança estão tão rasos!!

Acho essencial separar tempo pra ouvi-los. Assim, nós legitimamos o que eles sentem e pensam. Quando os escutamos e apreciamos isso, eles percebem que tem voz ativa e isso muda seu comportamento e sua visão de si mesmos; deixa-os livres para construir hipóteses, fazer colocações… Ensaiar e aprimorar o seu entendimento do mundo.

Vamos prestar atenção, dar tempo e oportunidade pra que os pequenos digam o que pensam? É importante pra eles, mas também é muito bom pra nós!

É uma delícia ver o mundo pelos olhinhos deles! Dê-se o direito de voltar a ser criança! E digo mais: há coisas que só uma criança consegue enxergar…

Além de tirar muita foto e gravar muito vídeo (nem tanto, ultimamente…), faço questão de anotar as frases e acontecimentos engraçados do Davi, desde que ele começou a falar.

Tenha esse hábito também! É muito gostoso ver o desenvolvimento do raciocínio, sem contar que serve pra matar saudades, e pra depois mostrar pro guri, quando estiver mais crescido!

Aqui estão alguns trechos da coletânea de “preciosidades” do Pedro Bloch, o Dicionário de Humor Infantil – Frases do cotidiano de crianças de 3 a 11 anos (infelizmente, já fora de catálogo):

ADULTO: “É uma pessoa que sabe tudo, mas quando não sabe diz logo: ‘veja na enciclopédia’.”

 ALEGRIA: “É um palhacinho no coração da gente.”

 AMAR: “É pensar no outro, mesmo quando a gente nem tá pensando.”

BOCA: “É a garagem da língua.”

 BONITA: “Se eu sou bonita ou inteligente? Se eu sou bonita, você vê na cara. E se eu sou inteligente, nem respondo a uma pergunta boba dessas.”

 CABELO: “É uma coisa que serve pra gente não ficar careca.”

 CALCANHAR: “É o queixo do pé.”

 CHOCOLATE: “É uma coisa que a gente nunca oferece aos amigos porque eles aceitam.”

 


COBRA: “É um bicho que só tem rabo.”

 CRIANÇA: “Ser criança é não estragar a vida.”

 DISTÂNCIA: “A Europa fica mais longe que a Lua. A Lua eu vejo.”

 ESCURO: “Tenho mais medo de avião que de escuro. É que escuro não voa, nem cai.”

 ESPERANÇA: “É um pedaço da gente que sabe que vai dar certo.”

 FUTEBOL: “É um jogo em que, às vezes, a trave joga melhor que o goleiro. Pega tudo.”

 FUTURO: “É tudo que vem depois e, quando chega, já era.”

 GÊMEAS: “Eu vi duas meninas de cara repetida.”

 


HORA: “A melhor hora da minha escola é a hora da saída.”

JARDIM ZOOLÓGICO: “O bicho que eu mais gostei, no jardim zoológico, foi o vendedor de sorvete.”

 MISTÉRIO: “É uma coisa que a gente não sabe explicar direito e, quando explica, já não é.”

 NEVOEIRO: “É poeira do frio.”

 


PACIÊNCIA: “É uma coisa que mamãe perde sempre.”

PAI: “Ser pai é mais difícil que ser mãe. Pai precisa usar gravata.”

POLUIÇÃO: “É sujeira do progresso.”

QUANDO PUDER: “É muito tarde.”

REDE: “É uma porção de buracos amarrados com barbante.”

REFLEXO: “É quando a água do lago se veste de árvores.”

RELÂMPAGO: “É um barulho rabiscando o céu.”

SAUDADE: “É quando uma pessoa que devia estar perto está longe.”

SOL: “Eu não errei na prova. Só disse que o Sol nasce no nascente e dorme no dormente.”

SONO: “É saudade de dormir.”

 SORTE: “É a gente acordar, se preparar pra ir pra escola e descobrir que é feriado nacional.”

 STRIP-TEASE: “É mulher tirando a roupa toda, na frente de todo mundo, sem ser pra tomar banho.”

VEIAS: “São raízes que aparecem no pescoço das meninas que gritam.”

 VIDA: “A vida a gente não explica. Vive.”

 



FONTE - https://minutocrianca.wordpress.com/2014/02/19/crianca-diz-cada-uma/


P
edro Bloch foi um médico foniatra, jornalista, compositor, poeta, dramaturgo e autor de livros infanto-juvenis russo naturalizado brasileiro. Escreveu mais de cem livros. Nascimento: 17 de junho de 1914, Jitomir, Ucrânia. Falecimento: 23 de fevereiro de 2004, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.