Confesso que desconhecia a palavra... E por ter ouvido pela primeira de
uma pessoa bastante espirituosa, pensei que ela estivesse “brincando”. Não era
brincadeira! E... fui “apresentada” a este neologismo, que traz em seus
significados o estado de ser, de vivência imbricada com presença e afeto, de
querer ser feliz e fazer feliz com responsabilidades diferentes da maternidade
e/ou paternidade. E assim, a intenção de sugerir registros sobre fatos
relacionados às avós e netos foi aceita por mim.
Tenho lido e ouvido sobre este estado de ‘ser avós’ em mídias, em redes sociais, na convivência com os mais próximos e muitas vezes, não me sinto representada, como quando sustentam a ideia de que “com a vovó tudo pode” - fazer birra, mexer em gavetas, bagunçar sem organizar, riscar em paredes, falar aos gritos etc.
Outra ideia propagada sobre a voternidade é que “a melhor coisa do
mundo”. Estas generalizações me incomodam por desconsiderarem as
especificidades de cada ser, suas histórias e seus contextos. Penso que a
voternidade não é diferente da vivencia processual de SER (mãe, pai, irmãos,
tios, primos, amigos etc), com momentos prazerosos, outros não tão prazerosos e
tantos incríveis e de pleno deleite.
Acredito que a voternidade pode disponibilizar presença, ajuda, relação
de afeto considerando sempre a necessidade dos pais e tendo a lucidez de que os
personagens principais da/na educação dos netos (e é bom que seja), são os
pais. A voternidade precisa dar espaço necessário para que a
maternidade/paternidade seja vivenciada.
Ao vivenciarmos a voternidade se fazem necessários alguns cuidados, como
evitar dizer “como se faz”, o que, por si só, não é fácil, pois a tentação de
interferir é grande. Muitas vezes visualizamos semelhanças em acontecimentos
vivenciados por nós avós, enquanto mães/pais. Vemos, de certa forma, histórias
se repetirem, mas é preciso respeitar o funcionamento, as regras, os combinados
estabelecidos e que fazem sentido para o núcleo familiar.
Importante destacar que os estreitamentos de laços, na voternidade como em
outras relações, necessitam de tempo de atenção, de ‘chamar atenção’, de ouvir,
de dar limites, do esforço para estar presente, mesmo que distante fisicamente,
pois os recursos tecnológicos disponíveis, não substituem o chamego, o olhar, o
cheiro, as graças ditas/feitas quando se está junto.
Poder vivenciar a voternidade é privilegio de viver a maternidade/paternidade de outra forma e, quem sabe, melhor! É poder experienciar com os netos as dimensões da vida, para que em seus corações sejamos boas lembranças, e estas, sejam base para seus futuros fazeres e saberes como pais.
Acredito que esta palavra traz em si a possibilidade de refletirmos
sobre as representações de avós e suas relações afetivas, na vida real e na
literatura. Representações estas que podem favorecer “o exercício” de valores
que humanizam.
Por fim, acredito que os valores que humanizam estão presentes nas
relações estabelecidas, o que me faz lembrar de muitas situações reais
vivenciadas pela/na voternidade.
Dentre estas lembranças, me veio à história O menino e seu amigo*, que narra a relação de Ziraldo, quando criança, e seu avô e a importância deste em sua vida.
Agradeço à pessoa que me apresentou o neologismo que despertou em
mim a intenção de fazer e socializar alguns registros sobre a temática.
* Menino e seu Amigo – Autor e Ilustrador Ziraldo Alves Pinto –
Editora
Melhoramentos, 2012.
Ziraldo vida dedicada à literatura e à ilustração para crianças. Artista gráfico, humorista, escritor de livros infantis, ilustrador, cartunista, caricaturista, dramaturgo, jornalista e bacharel em Direito. Nasceu em 24 de outubro de 1932 em Caratinga, Minas Gerais. Casou-se com D. Vilma e tem três filhos, Fabrizia, Daniela e Antônio.
Sônia Peixoto
https://smapeixoto.blogspot.com.br/
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