O que é Serenidade?
Por Equipe Flávio Gikovate (17/09/2016)
O termo serenidade costuma estar associado a
mais de um significado, sendo que o primeiro deles tem a ver com a capacidade
de algumas pessoas de lidar com docilidade e tolerância com as situações mais
adversas, especialmente aquelas que não dependem de nós.
Muitas vezes nos
angustiamos e perdemos a serenidade quando nos sentimos pressionados por
expectativas que nós mesmos produzimos em relação aos nossos projetos; é
preciso cautela para que nossos planos de futuro, nossos sonhos e esperanças
não se transformem em pesadelos e fontes de tensão e de decepções. Os que fazem
planos mais realistas sofrem menos e se aproximam mais da serenidade.
A serenidade corresponde a um estado de espírito no qual nos
encontramos razoavelmente em paz, conciliados com o que somos e temos, com
nossa condição de humanos falíveis e mortais. É claro que tudo isso depende de
termos atingido uma razoável evolução emocional e mesmo moral: não convém nos
compararmos com o que são ou tem as outras pessoas, não é bom nos revoltarmos
com o fato de não sermos exatamente como gostaríamos; conciliados com nossas
limitações, podemos usufruir da melhor maneira possível as potencialidades que
temos.
Um aspecto que considero
muito importante para a questão da serenidade
é a competência dos indivíduos para lidar com o tempo. Um exemplo disso é a
inquietação que toma conta de muitos quando, presos no trânsito, não conseguem
chegar a um encontro na hora marcada. Apesar do atraso não ser da
responsabilidade deles, sofrem e se sentem por vezes até mesmo culpados pelo
que está acontecendo. Chegam ao local esbaforidos e demoram um bom tempo para
se recuperarem de um problema que, como regra, não tem a menor importância
concreta.
Outra peculiaridade dessa
dificuldade de lidar com o tempo própria da maioria das pessoas tem a ver com a
condição de quem espera um acontecimento, o resultado de uma prova que irá
indicar sua aprovação – ou não – em um concurso, a expectativa nervosa diante
do resultado de um exame médico que irá dizer da sua condição de saúde.
Saber
esperar é uma das virtudes mais raras que tenho conhecido e
certamente contribui enormemente para que uma pessoa desenvolva esse estado de
calmaria correspondente à serenidade. Sim, porque é fato que, de certa forma,
estamos continuamente esperando eventos que irão influenciar nossas ações
futuras.
O momento presente é
sempre uma ficção: vivemos entre as lembranças do passado e a esperança de
acontecimentos futuros que buscamos, mais ou menos ativamente, alcançar. A
regra é que estejamos indo atrás de alguns objetivos, perseguindo-os com mais
ou menos determinação e persistência.
A maior parte das pessoas
se sente muito triste quando está sem projetos, apenas usufruindo dos prazeres
momentâneos que suas vidas oferecem. Somos
pouco competentes para vivenciar o ócio. Esse estado de não querer nada,
não estar buscando nada e que os filósofos antigos consideravam como muito
criativo é algo gerador de um estado de alma que chamamos de tédio e que não
deixa de ser uma forma peculiar de depressão. No tédio nos perguntamos acerca
do sentido da vida e, como não temos meios de responder a essa pergunta, nos
deprimimos.
De uma certa forma,
fazemos tudo o que fazemos com o objetivo de fugir do ócio e do tédio que o
acompanha. Mesmo nos períodos de férias percebidas como merecidas – por termos
sido capazes de produzir bastante – temos que nos ocupar: abandonamos nossos
afazeres habituais e nos entretemos com a visita a lugares que não conhecemos,
com a prática de esportes exigentes, com a leitura… Aqueles que não são capazes
de se deleitar com essas outras ocupações, tendem a fazer uso excessivo do
álcool ou de outras drogas. A verdade é que poucos são os que conseguem ficar
em paz em prolongada inatividade.
Por outro lado, perseguir
objetivos com obstinação e aflição de alcançá-los o quanto antes também subtrai
a serenidade. Assim, perdemos a serenidade quando andamos muito devagar, perto
da condição do ócio – que traz o tédio e a depressão – e também quando nos
tornamos angustiados pela pressa de atingirmos logo nossas metas. Mais uma vez,
a sabedoria, a virtude está no meio, naquilo que Aristóteles chamava de
temperança: cada um parece ter uma “velocidade ideal”, de modo que se andar
muito abaixo dela tenderá a se deprimir, ao passo que se andar muito acima dela
tenderá a ficar muito ansioso.
Interessa pouco
comparar nossa velocidade com a dos outros, posto que só estaremos bem quando
estivermos em nosso ritmo, qualquer que seja ele. Conhecer a si mesmo implica, entre outras coisas, conhecer a velocidade
na qual nos sentimos confortáveis e conseguimos andar com competência e
serenidade.
Fonte -
http://flaviogikovate.com.br/o-que-e-serenidade/ (Página administrada por sua
equipe).
Sobre Flávio Gikovate - nasceu em São
Paulo (11 de janeiro de 1943) e faleceu em São Paulo (13 de outubro de 2016) foi um médico
psiquiatra, psicoterapeuta e escritor brasileiro.
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